Conímbriga é uma
das poucas cidades romanas antigas que chegou até aos dias de hoje num estado “original”, ou pelo menos, na forma de ruínas-museu, por ter estado soterrada quase
durante mil anos.
Os vestígios da
cidade começaram a aflorar e a serem conhecidos ainda no século 19, todavia só no
século 20 foram organizadas escavações e estudos de carácter científico que
revelaram toda a extensão das construções antes escondidas debaixo de terras.
É em
Condeixa-a-Nova, vila a cerca de dois quilómetros de Conímbriga, que o Trail
com o mesmo nome é organizado há cerca de dez anos pela associação “O Mundo da
Corrida”.
Referi em relatos
de participações anteriores que esta organização "O Mundo da Corrida" tem a cabeça no sítio, não se
deixando levar por modas que, nos últimos anos transformaram provas de trail em
autênticos treinos de Comandos ou de Rangers. Não tenho nada contra isso,
todavia não contem comigo para “apanhar porrada de criar bicho” e pagar ainda
por cima! (não me esqueço das “tareias” apanhadas na vizinha Serra da Lousã, onde ora, era andar
nove horas a escorregar à beira de cascatas gelado até aos ossos, ora era, assar
durante dez horas e meia num dos dias mais quentes de 2015…)
Ainda assim, o Trail de Conímbriga Terras de Sicó tem uma versão de 111 quilómetros onde os mais treinados (ou sem juízo)
podem extravasar as suas energias.
O PelaEstradaFora Paulo Amaro - Photo by Kabazuk |
A “equipa” do PelaEstradaFora
contentou-se com a versão “pequena” de 57 quilómetros sendo que, na parte que me
toca, chega e sobra para me encher as medidas e para não querer ouvir sequer falar
de trails durante uns tempos 😊
O PelaEstradaFora Paulo Oliveira - Photo by Kabazuk |
Nesta versão de
2020, a prova intermédia de 50k+ teve a sua partida em Santiago da Guarda, uma
pequena localidade na zona de Ansião, seguindo depois na direção do percurso
dos anos anteriores, com que, a partir do quilómetro nove teve a maior parte em
comum.
O transporte para
a zona da partida foi feito de autocarro, à imagem de 2018 e 2019.
O PelaEstradaFora Paulo Amaro |
O tempo estava
chuvoso e frio, desagradável mesmo, diria eu.
Nos preparativos
em Condeixa, antes de embarcar no autocarro, tinha-me esquecido de um buff
tendo apenas um boné para proteger a cabeça.
Tal esquecimento
deixou-me deveras aborrecido; o vento nos ouvidos é uma coisa que detesto solenemente!
O PelaEstradaFora Paulo Oliveira |
À hora marcada
deu-se a partida, ainda debaixo de alguma chuva, que no entanto ia diminuindo
gradualmente. Mais tarde parou de chover completamente tendo o tempo ficado muito
bom mesmo, sem frio nem calor.
Fase inicial da prova, muita água nos caminhos! |
Já sabendo com
que contar, ia gerindo o esforço com alguma contenção, uma vez que lá para o
final costumam aparecer uns trilhos muito técnicos onde tradicionalmente tenho
algumas dificuldades, por isso, convém chegar lá com algumas reservas de
energia…
A gestão da
hidratação é feita criteriosamente, levando duas garrafas na parte frontal da
mochila sendo sempre atestadas nos abastecimentos.
Fase inicial - Atingindo um topo de um monte qualquer... |
Logo no primeiro
abastecimento experimento uma água gaseificada com aroma de limão e resolvo
encher uma das garrafas com essa água e outra com coca-cola.
Não fico surpreendido
com a qualidade dos abastecimentos.
À imagem das
edições anteriores, os abastecimentos são de qualidade superlativa dando vontade
de mandar a prova às urtigas e aproveitar tudo o que está à disposição.
Ao quilómetro nove - a parede da prova! |
Também nos
abastecimentos tenho a maior contenção, optando apenas por coisas simples e que
a que estou habituado, tipo marmelada, bananas, batatas fritas (poucas) e um ou
outro quadrado de chocolate. Em provas tão longas como esta, o sistema
digestivo começa a acusar o esforço e podem ocorrer alterações indesejadas.
As paragens nos
abastecimentos quebram sempre o ritmo, pelo que o recomeço é sempre penoso. Tento
sempre não demorar mais do que três ou quatro minutos em cada um.
No recomeço após o segundo ou terceiro abastecimento, sigo em esforço, tentando entrar no ritmo,
quando de repente dá-se um estrondo do lado direito do peito, quase semelhante
a um tiro e eu penso: “olha, o coração já era!”. Mas não; tinha sido apenas a
garrafa do lado direito carregada com coca-cola, que tinha ganho pressão com os
solavancos e tinha disparado pelo bocal com um estrondo. Nunca pensei que o
aumento da pressão de uma inocente coca-cola provocasse um efeito tão sonoro!
A corrida ia seguindo por montes e vales, privilegiando sempre carreiros em detrimento de
estradões, o que evidencia um trabalho formidável da organização desta prova.
O PelaEstradaFora Paulo Amaro - Photo by Fotojotapê |
Para os atletas
da “prova pequena” é bom e mau ao mesmo tempo! Passo a explicar.
Por um lado é bom
porque há sempre contacto visual com outros atletas, uma vez que a fusão dos
percursos duplica a quantidade de atletas na mesma zona do
percurso. Ainda assim, a certa altura andei cerca de meia hora sem ver ninguém,
o que é meio caminho para me perder!
O PelaEstradaFora Paulo Oliveira -Photo by Fotojotapê |
Puro engano! “Esses”
que vão mais lentos são melhores do que nós, e vão àquela velocidade porque já
têm mais cinquenta quilómetros do que nós nas pernas e andam ali desde a meia
noite!
Pelo vale de canhão de poios |
Forço então sempre
o ritmo com a estratégia mental de me convencer que tenho de ir mais rápido do
que “esses” dos dorsais azuis, porque seria uma vergonha não o a fazer!
Algures na Serra de Sicó |
Por fim chego à
tal zona técnica que há dois anos me trouxe as maiores dificuldades: o Trilho
da Cascata!
O Trilho das
Cascatas tem cerca de 2 quilómetros, o que relativizando, é 20 vezes menos do
que os Abutres, comparação possível devido às semelhanças.
De qualquer modo,
chegar a um trilho destes, já com 50 quilómetros nas pernas exige um esforço
acrescido, numa altura em que já só pensamos em terminar a prova e tomar um
banho quente!
Nesta altura já
venho há mais de meia hora sem ver ninguém.
Esforço-me por prestar a maior atenção às fitas e bandeirinhas de sinalização a fim de não me
enganar no caminho.
Já no Trilho da
Cascata aparecem as primeiras cãibras devido aos
movimentos mais amplos e repentinos exigidos pela tecnicidade do trilho.
Começo a ouvir atrás
de mim vozes ao longe e penso com desgosto que vou novamente perder muitos lugares,
tal como nos anos anteriores, nesta mesma zona da prova…
Assim é de facto!
Quando um grupo de atletas me alcança, desvio-me para os deixar passar. Não vale
a pena arriscar. O sacrifício para terminar a prova já vai bastar, não vale a
pena arriscar uma queda feia nesta zona.
Trilho das Buracas de Casmilo |
A cascata que dá
o nome ao trilho está seca mais uma vez, no entanto, os trilhos rochosos estão perigosamente
escorregadios, exigindo a maior atenção e o máximo cuidado.
Mais uma vez,
perco mais de 15 lugares nestes dois quilómetros do Trilho da Cascata.
Quando saio do
vale da cascata, por uma “subida de cão” por sinal, sinto que tenho a prova
feita apesar de faltarem ainda três ou quatro quilómetros!
Passagem pelo exterior das ruínas de Conímbriga |
Atinge-se finalmente
a civilização, com a passagem pelo exterior das ruínas de Conímbriga (nos anos
anteriores passámos pelo interior das mesmas…), depois vem Condeixa-a-Velha e
finalmente Condeixa-a-Nova ao fim de 8h12 de prova.
O colega de
equipa, Paulo Amaro, já tinha chegado há quase uma hora, o que também não me
surpreendeu!
Enfim, mais um
dia bem passado e uma dor de pernas ao longo da semana seguinte 😊
A classificação que interessa:
A classificação que interessa:
- Posição Nome Tempo
- 61 Paulo Amaro 7:21:06
- 106 Paulo Oliveira 8:12:06
Fiquem bem!
ResponderExcluirObrigado, um abraço!
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